“O conteúdo de uma mídia é sempre outra mídia”. (MCLUHAN, 1971)
Todo o dinamismo que é criado na construção de um objeto de nova mídia passa por um processo que é conhecido por remediação. O que parece novo nesse meio, na verdade é uma forma renovada das “velhas mídias” (older media), passando a caracterizar uma mídia renovada (refashion). Para Bolter & Grusin (2000), esta é uma característica que define bem as novas mídias pelo fato de as mídias digitais remediarem de forma constante seus antecessores (rádio, mídia impressa, televisão, etc), “o trabalho torna-se um mosaico no qual somos simultaneamente conscientes das peças individuais” (BOLTER; GRUSIN, 2000). O que é importante na remediação não é o que foi alterado em si, mas ressaltar a melhoria que foi dada a essa “velha mídia”.
O surgimento de todo novo meio é justificado porque ele preenche a lacuna ou repara a falha do seu antecessor, pois ele cumpre a promessa quebrada de uma velha mídia. (Tipicamente, é claro, os usuários não se dão conta de que a velha mídia falhou em sua promessa até o surgimento de um novo meio). (BOLTER; GRUSIN, 2000, tradução nossa)
Para os autores, “um meio é aquilo que remedia. Aquilo que se apropria das técnicas e significados sociais de outra mídia e cuja pretensão é dar-lhes vida ou repaginá-las em nome do real” (BOLTER; GRUSIN, 2000, tradução nossa). Os jogos de computador possuem forte influência dos jogos de tabuleiro, a partir de sua estrutura básica: a sua interface. Além desta referência, nos primórdios do videogame a temática que perdurou por alguns anos eram jogos esportivos (por exemplo, PONG! e suas incontáveis variações), assim como a existência de versões digitais de esportes como o golf e o futebol os quais remediam ao menos dois níveis segundo Bolter e Grusin:
Os esportes são eventos ensaiados, e ao mesmo tempo performances televisionadas, suas versões computadorizadas podem reformular a experiência de ambos. No caso games esportivos se apropriam dos esportes em si, pois passam a proporcionar pro usuário a experiência tanto do jogo quanto performance. (BOLTER; GRUSIN, 2000)
Foi preciso criar toda uma alfabetização visual para os usuários de videogame. Esse “empréstimo” dos elementos de outras mídias já existentes proporcionam toda uma familiaridade e um algum tipo de referencial para essa nova mídia. Para Mark J.P. Wolf,
games com gráficos representacionais muitas vezes se apoiam em convenções de outras mídias audiovisuais, e progressivamente, em convenções estabelecidas nos primeiros videogames, dando-lhes uma familiaridade intrínseca que permite aos jogadores começar jogando sem ter de aprender a interface. (WOLF, 2003)
Os jogos de computador multiplicam e remediam o seu mecanismo por conta de sua presença nas mais variadas plataformas: fliperama, consoles que se conectam à televisão, CD-ROM (ou DVD) para computadores, jogos portáteis (Game Boy, Nintendo 3DS, PS Vita), e games em sites e servidores na internet (sejam reproduzidos no próprio computador ou em televisão com conversor). Toda essa abrangência da tecnologia aliada as novas mídias, fez dos jogos digitais uma das indústrias de entretenimento mais considerável (financeiramente), além de fortalecerem a comercialização dos computadores. Os mesmos têm ganhado destaque no mercado de entretenimento, onde alguns deles contam com grandes campeonatos em nível mundial sendo considerados hoje como e-sports (esporte eletrônico) e seus jogadores reconhecidos como atletas. Com esta nova forma de olhar para os games, as partidas dessas competições são narradas e possuem estruturas físicas como se fossem um jogo de futebol ou qualquer outro esporte. Pode-se identificar que o lúdico se apresenta de modos bastante diversificados nesta cultura gamer, principalmente na forma em que tais jogos digitais se realizam tanto em seu próprio ambiente (máquina) quanto num campo midiatizado (transmissões em canais de YouTube, ou ainda em canais específicos da televisão – algumas finais de campeonato de jogos eletrônicos).
Hoje, não existem mídias que sejam isoladas umas das outras sem ter alguma relação ou conectividade. Com este novo formato de mídia, para Bolter e Grusin (1999), é a experiência de forma autêntica do observador que dá sentido nesse processo. A hipermediação procura reproduzir essa experiência sensorial humana ampliando e destacando os elementos da mediação, trazendo um ambiente diversificado, dividido por janelas (windowed style) onde cada uma possui suas particularidades independentes (significado, identidade visual, programação, estilo gráfico, etc). Essa sobreposição de várias janelas no monitor permite com que a interface “desapareça” para o usuário. Conforme trazem em sua obra, Bolter e Grusin (2000) atestam o fato de que todo e qualquer meio pode remediar, tem a capacidade de se apropriar das características de outras mídias e renová-las (técnicas, formas, significado social). Isso proporciona ao usuário uma via de mão dupla em meio ao processo de remediação: a busca pela transparência para negar a própria mediação do meio, e a tentativa de conseguir a imediação de qualquer forma por meio da multiplicidade da hipermediação.
O imediatismo que emerge nos tempos de hoje por conta dos meios digitais e da internet possui uma prática representacional e também toda uma lógica cultural. A prática da hipermediação não é evidente somente em páginas da Web, mas também em alguns jogos de computador por fazerem uso de inúmeras telas em paralelo na mesma superfície. Passa a ser um estilo visual, onde “os privilégios da fragmentação, a indeterminação e a heterogeneidade […] enfatizam o processo ou o desempenho ao invés de um objeto de arte finalizado” (MITCHELL, 1994). A montagem que é construída torna-se uma linguagem padrão a fim de organizar todos os elementos que compõem uma imagem.
REFERÊNCIAS
BOLTER, Jay David; GRUSIN, Richard. Remediation: understanding new media. Cambrigde: MIT Press, 2000.
GALLOWAY, Alexander R. Gaming: Essays on Algorithmic Culture. Published by the University of Minnesota Press, 2006.
MANOVICH, Lev. The language of new media. Massachusetts: MIT Press, 2001.
MCLUHAN, M. Os meios de comunicação como extensões do homem: a formação do homem tipográfico (trad. Décio Pignatari). São Paulo: Cultrix, 1971.
MITCHELL, William J.T. Picture Theory. Chicago: University of Chicago Press, 1994.
WOLF, M. Abstraction in Video Games in Wolf, Mark J.P.; PERRRON, Bernard (org.). The video game theory reader. London: Routledge, 2003.