Gamic action, four moments

Para dar início, trago uma breve apresentação sobre o autor. Alexander R. Galloway é um pesquisar do Departamento de Mídia, Cultura e Comunicação da Universidade de Nova Iorque. Seus trabalhos se destacam em meio a tecnocultura ao considerar algoritmos como objetos culturais. Um de seus trabalhos de destaque é “Gaming: Essays on Algorithmic Culture”, livro o qual o capítulo trabalhado aqui faz parte.

O videogame é um objeto cultural, ligado à história e à materialidade, composto por um dispositivo computacional eletrônico e um jogo simulado em software. Portanto, é considerado um enorme meio cultural envolvendo um grande número de máquinas orgânicas e inorgânicas. Mas antes de adentrar nestas questões, Galloway no início de seu texto traz a seguinte linha de pensamento: se as fotografias são imagens e se os filmes são imagens em movimento, então os videogames são ações. Ou seja, para o autor jogos são ações tanto do operador (jogador) quanto da própria máquina, onde tais ações podem estar na diegese ou fora dela. Se excluirmos a participação ativa de jogadores e máquinas, os videogames passariam a ser meros códigos de um computador estático. Existem, sim, ações que são realizadas por quem joga, mas do mesmo modo existem várias outras realizadas pela máquina (podendo ser resposta a alguma ação do jogador como algo já existente na natureza do jogo). Portanto, para entender os videogames, é necessário entender como essa ação existe no jogo, atentando para suas inúmeras variações e intensidades.

É necessário resistir conduzir essa ação do jogo como uma mera teoria da “interatividade” ou ainda como uma teoria da “audiência ativa” da mídia. Tratar de uma audiência ativa seria como afirmar que o público sempre traz suas próprias interpretações e recepções do trabalho, enquanto aqui não existe passividade de nenhum dos lados (máquina e operador). Por conta disso, Galloway deixa claro que suas afirmações estão enraizadas na cibernética e na tecnologia da informação, onde um meio ativo é aquele cuja própria materialidade se move e se reestrutura (metáfora utilizada pelo autor pois a cibernética é uma ciência criada por Norbert Wiener e que trata das relações humano-máquina). Ou seja, o jogo e/ou videogame é um meio baseado em ação por conta de seus modos de ser e agir, que vão se atualizando e se desenvolvendo simultaneamente, a partir de técnicas, práticas, atitudes, tanto comunicacionais quanto tecnológicas.

Fazendo um primeiro movimento de aproximação de conteúdos vistos na disciplina de Tecnologias e Culturas Midiáticas, identifica-se um pouco da definição de cibercultura a qual possui um “conjunto de técnicas (tanto materiais quanto intelectuais), de práticas, atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço” (LÉVY, Pierre, 1997). Cibernética, trazida pelo Galloway, nada mais é do que a própria máquina. Portanto, a cibercultura é a cultura no meio do ciberespaço que contém a cibernética.

Os meios de comunicação, de cinema, literatura, televisão entre outros continuam a se envolver em vários debates em torno da representação, textualidade e subjetividade. Nesse meio tempo, eis que surge nos últimos anos um novo meio: os computadores e em especial os jogos de videogame. Com estes surgimentos temos uma quebra, onde a fundação não está no olhar e na leitura, mas sim na instigação da mudança material por meio da ação. Na década de 70, antes mesmo da revolução digital provocada pela internet, Marshall McLuhan trazia a ideia de que a tecnologia poderia ser considerada uma extensão do próprio corpo humano, intensificando suas ações, em sua teoria “os meios de comunicação como extensões do homem”. A partir dessa teoria, o autor explora os contornos dos nossos próprios seres, prolongados em nossas tecnologias, buscando um princípio de inteligibilidade em cada um deles. Os computadores com o tempo foram evoluindo e assim abrindo novas perspectivas no mercado mundial: inicialmente com a robótica, na sequência a digitalização da informação e, por fim, a internet e seus navegadores. Outro autor que também se destaca é Manuel Castells, onde afirma que desde a década de 80, novas tecnologias começaram a revolucionar o mundo da mídia e reconfigurar o que até então chamávamos de “comunicação de massa”. Pegando carona nessa ideia a partir da leitura do texto de Galloway, o videogame é visto como um meio de comunicação de massa nos anos 70, o qual faz mexer com uma nova economia mediada por máquinas e outros artefatos da informática.

Galloway afirma em seu texto que em meio a esfera da mídia eletrônica, “os jogos são fundamentalmente sistemas de softwares cibernéticos envolvendo atores orgânicos e não-orgânicos” (“In the sphere of electronic media, games are fundamentally cybernetic software systems involving both organic and nonorganic actor”). Um videogame, portanto, não é simplesmente um brinquedo divertido, mas sim uma máquina algorítmica e, como todas as máquinas, funciona através de regras de operação específicas e codificadas. Ou ainda, videogames são jogos, mas, ainda mais importante que esta afirmação, são sistemas de software, e é a partir desta perspectiva que seu livro irá se desdobrar.

Seguindo o raciocínio de Galloway, percebe-se que é muito comum o algoritmo, por mais simples que seja, ser de alguma forma mascarado em meio a superfície de um jogo o qual já se faz bastante familiar para quem o joga (matar todos os inimigos enquanto recolhe o elixir da vida; ir para o próximo nível do mapa, etc). O algoritmo é a chave para toda a experiência do jogo, pois é preciso solicitar que o jogador/operador execute determinado algoritmo para ganhar a partida. Sendo assim, aproximando um pouco de Lev Manovich (2001), “jogos são uma forma cultural que requer comportamento algorítmico dos jogadores”.

Outro movimento de aproximação de conteúdos vistos a disciplina, se faz a partir do apontamento que o autor traz em seu texto, dizendo: “James Newman usa o termo ‘offline’ para descrever esses momentos de passividade do jogador, em oposição aos momentos ‘on-line’ da jogabilidade real” (tradução nossa — “James Newman uses the term “offline” to describe these moments of player passivity, as opposed to the “on-line” moments of actual gameplay”). A “separação”/”oposição” tratada aqui referente ao estado on/off, se faz assertiva pois não exclui nem um, nem outro. Pelo contrário, reforça que o que acontece “on” afeta no “off” (questões de comportamento, ações). Isso tudo existe na materialidade no mesmo instante em que tudo está acontecendo simultaneamente.

“Há uma certa quantidade de reaproveitamento e remediação acontecendo aqui, provocada por uma nostalgia pela mídia anterior e um medo da singularidade pura dos videogames (como McLuhan escreveu nas páginas de abertura do Understanding Media, o conteúdo de qualquer novo meio é sempre outro meio)”. (GALLOWAY, 2006, tradução nossa)

Os próprios jogos de computador multiplicam e remediam o seu mecanismo por conta de sua presença em variadas plataformas: fliperama, consoles que se conectam a televisão, CD-ROM (ou DVD) para computadores, jogos portáteis (Game Boy, Nintendo 3DS, PS Vita), e games em sites e servidores na internet (sejam reproduzidos no próprio computador ou em televisão com conversor). Toda essa abrangência da tecnologia aliada as novas mídias, fez dos jogos digitais uma das indústrias de entretenimento mais considerável (financeiramente), além de fortalecerem a comercialização dos computadores.

Retomando um dos pontos principais de seu texto, Galloway determina dois eixos para trabalhar as ações do jogo: diegético e não-diegético; operador e máquina. Com isso, formam-se quatro grupos, cada um sendo um tipo de jogo: um jogo de aventura com muita história e pouca interação, o maquínico é diegético; jogos de luta, o operador é diegético; jogos de RPG, de estratégia e simulação, o operador é não-diegético; e um glitch e/ou power ups dentro do jogo, o maquínico é não-diegético (Figura 1). As ações não são feitas só pelo jogador (operador), mas também existem ações referentes à máquina. Cria-se um diálogo constante entre máquina e operador, dentro e fora da diegese. O operador não é passivo, da mesma forma que a máquina também não é.


Figura 1 — Esquema dos eixos trabalhados por Galloway.

Em resumo, Galloway delineou em seu texto um sistema de quatro partes para melhor entender a ação em videogames (Figura 2): o jogo é um processo puro tornado perceptível na ressonância maquínica dos atos da máquina diegética; o jogo é um algoritmo subjetivo, uma intervenção de código exercida tanto dentro do jogo quanto sem jogabilidade na forma do ato do operador não-diegético; o jogo é um ritual de jogadores transportados para o lugar imaginário da jogabilidade e atuado na forma de atos de operadores diegéticos; o jogo é o jogo da estrutura, uma agitação generativa entre o interior e o exterior, efetuada através do ato da máquina não-diegético. São quatro momentos, quatro sugestões. Eles não devem, de forma alguma, ser considerados como “regras” fixas para os videogames. Estes não são tipos ideais, são observações provisórias que surgem de uma análise das especificidades materiais do meio.


Figura 2 — Quadro resumo para as ações do jogo.

Para fechar o raciocínio do presente trabalho, Galloway apresenta uma ideia de uma ontologia dos jogos, trazendo como principal ponto a definição de que jogos são ações. Aproximando do campo da cibercultura e da tecnologia da informação (onde o meio ativo é aquele que com sua própria materialidade se move e se reestrutura), o videogame possui um modo de ser e de agir, onde a atualização do jogo se move e se reestrutura no próprio meio, a partir de técnicas, práticas, atitudes, tanto comunicacionais quanto tecnológicas. Existe aqui uma conexão entre os videogames e a cultura algorítmica contemporânea. A partir do momento em que alio a fala do autor referente a essas relações homem/máquina/software (incluindo aqui as quatro ações do jogo), de teóricos como Castells e McLuhan, acabo aproximando do que são movimentos/atitudes que acontecem em meio ao ciberespaço.

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